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📌 Lesão cística com reabsorção apical e invasão do seio maxilar: abordagem diagnóstica e terapêutica.


Por Prof. Dr. Marco Aurélio G. Borges – Endotoday


🔍 Introdução

As lesões periapicais de origem endodôntica, quando não diagnosticadas precocemente, podem evoluir para processos extensos que invadem estruturas adjacentes, como o seio maxilar. A tomografia computadorizada de feixe cônico (CBCT) é uma ferramenta indispensável na avaliação tridimensional dessas lesões, permitindo a análise precisa da sua extensão e relação com estruturas nobres.

Neste post, analisamos um caso clínico evidenciado por CBCT que apresenta uma reabsorção apical severa em pré-molar superior, associada a uma lesão compatível com cisto radicular que invade o assoalho do seio maxilar — um exemplo clássico de sinusite odontogênica de origem periapical.



🖼️ Imagem tomográfica da lesão cística .

As imagens apresentadas mostram:

  • Plano sagital (Vídeo 1): destruição óssea periapical extensa envolvendo o ápice do segundo pré-molar superior, com áreas hipodensas bem delimitadas, compatíveis com processo lesão cística.


Plano Sagital 1
  • Plano coronal (Vídeos 3): continuidade da lesão com o seio maxilar, evidenciando espessamento da mucosa e perda da cortical do assoalho sinusal.

Plano Coronal

🦷 Diagnóstico diferencial

A principal hipótese diagnóstica é um cisto radicular de origem bacteriana, associado a necrose pulpar. Outros diagnósticos diferenciais incluem:

  • Granuloma periapical;

  • Cisto residual (se houver histórico de extração recente);

  • Lesões não odontogênicas (menos provável neste contexto clínico e anatômico).


💬 Conduta clínica sugerida


1. Tratamento Endodôntico Não Cirúrgico – Primeira Escolha

O tratamento endodôntico não cirúrgico permanece como a conduta de primeira escolha nos casos de infecção ou necrose pulpar com ou sem lesões periapicais. Abaixo, descrevem-se as etapas recomendadas para a condução terapêutica:

1. Acesso coronário e exploração inicial

  • Realizar abertura coronária adequada, respeitando a anatomia interna do dente;

  • Remover completamente o tecido cariado e qualquer material restaurador contaminado;

  • Identificar todos os canais radiculares com auxílio de magnificação (microscópio operatório) e ultrassom.

2. Determinação do comprimento de trabalho

  • Utilizar localizadores apicais eletrônicos calibrados e confirmados com imagem periapical;

  • Confirmar a localização da constrição apical, preferencialmente com base em evidências microtomográficas recentes quando possível.

3. Preparo biomecânico

  • Instrumentar mecanicamente com sistemas rotatórios ou reciprocantes, respeitando o diâmetro e a curvatura do canal;

  • Irrigação concomitante com hipoclorito de sódio a 2,5%, podendo ser elevada a 5,25% nos casos com maior carga infecciosa;

  • Ativar a irrigação com ultrassom passivo (PUI) ou com sistemas de agitação sonic ou laser, conforme disponibilidade.

4. Medicação intracanal

  • Secar os canais com cones de papel estéreis;

  • Inserir hidróxido de cálcio associado a PMCC (propilenoglicol + macrogol), utilizando seringas ou cânulas específicas;

  • Manter a medicação por um período de 14 a 30 dias, com trocas sucessivas em casos de exsudato persistente;

  • O tempo total de medicação não deve exceder 3 meses para evitar o risco de enfraquecimento dentinário.

5. Avaliação da secagem do canal

  • Reavaliar a possibilidade de secagem completa com cones de papel;

  • Se ainda houver exsudato, repetir a medicação intracanal com novo intervalo de 14 a 21 dias.

6. Obturação tridimensional

  • Com os canais devidamente secos, proceder à obturação com técnica adequada (cone único ou técnica híbrida);

  • Utilizar cimento biocerâmico (como Bio-C Sealer, MTA Fillapex, TotalFill BC Sealer) ou cimento biocompatível(como AH Plus, Sealapex);

  • Confirmar a obturação por radiografia periapical digital com pelo menos dois ângulos.

7. Restauração coronária imediata

  • Realizar selamento coronário provisório com cimento de ionômero ou resina temporária;

  • Planejar restauração definitiva o mais breve possível para prevenir reinfecção.

8. Reavaliação clínica e por imagem

  • Agendar reavaliações clínicas e tomográficas (CBCT) semestrais, por pelo menos 2 anos;

  • Observar sinais de reparo ósseo, ausência de sintomatologia e manutenção do selamento coronário;

  • Em casos de falha, considerar retratamento ou abordagem cirúrgica.

Estudos indicam que até 85% das lesões císticas associadas à necrose pulpar podem regredir totalmente após terapia endodôntica adequada (Nair, 1998; Ricucci et al., 2006).

2. Tratamento cirúrgico (em casos refratários)

  • Apicectomia com curetagem da lesão periapical.

  • Enucleação total do cisto.

  • Obturador retroapical com MTA ou biocerâmicos.

  • Preenchimento com LPRF.

  • Reparação da comunicação oroantral, se presente, com biomateriais ou membranas reabsorvíveis.


Preenchimento com LPRF

3. Avaliação conjunta com otorrinolaringologia

  • Sinusites odontogênicas com envolvimento de mucosa sinusal devem ser acompanhadas por otorrino.

  • Em alguns casos, indica-se antibioticoterapia sistêmica: Amoxicilina + Clavulanato (875 + 125 mg, 12/12h) ou Clindamicina (em caso de alergia a penicilina).


4. Exodontia (último recurso)

Indicada apenas quando:

  • Há fratura radicular;

  • A reabsorção radicular é extensa e irreversível;

  • O dente não é mais restaurável.


📈 Prognóstico

Com planejamento adequado e tratamento endodôntico baseado em evidências, há alta taxa de sucesso. Lesões císticas podem regredir significativamente entre 6 e 12 meses. A resolução da sinusite também acompanha a eliminação da infecção periapical, na maioria dos casos.


📚 Referências

  • Nair, P. N. R. (1998). New perspectives on radicular cysts: do they heal? International Endodontic Journal, 31(3), 155–160.

  • Patel, S., Durack, C., Abella, F., et al. (2015). Cone beam computed tomography in Endodontics – a review. International Endodontic Journal, 48(1), 3–15.


📌 Conclusão

Este caso exemplifica a importância de integrar o diagnóstico por imagem com a clínica e o conhecimento da anatomia regional. A atuação precoce e fundamentada do cirurgião-dentista pode evitar cirurgias extensas e restaurar a saúde periapical, promovendo a manutenção do dente em função.



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